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O QUE TEM POR TRÁS DE UMA CAIXA BONITA

por Soledad Barruti
Foto: Nacho Yuchark
Publicado em 08 de agosto 2021

 

O consumo de alimentos ultraprocessados ​​que desencadeiam doenças não transmissíveis – a primeira causa de morte na região – começa com uma armadilha: as embalagens sedutoras na gôndola. Detê-las é assumir um compromisso pelo direito à informação e à saúde. Mas, para as marcas, qualquer discussão é uma declaração de guerra.

A escolha de um alimento é um ato de impulso. As marcas têm pouco tempo para chamar a atenção – em média 8 segundos. Assim, cada pacote se torna uma poderosa arma de conquista. É por isso que alguns produtos mudam a embalagem mês a mês, embora o alimento que contém permaneça o mesmo: para renovar o efeito. No supermercado, parecemos nos comportar de maneira muito racional, mas somos criaturas com determinação biológica: buscamos a diversidade. E também segurança. Isso explica por que existem outras caixas, latas, embalagens que permanecem quase inalteradas desde que foram lançadas: as de maior sucesso da gôndola.

Cada cor, cada personagem, cada frase é cuidadosamente escolhida, com eficiência perturbadora. Se antigamente as marcas precisavam de um estudo cuidadoso e longo para descobrir o que seus clientes queriam, hoje elas têm ferramentas que revelam seu inconsciente em um instante. Em alguns dos laboratórios das marcas, há pessoas que se conectam a sensores, detectores de piscadas e movimentos faciais, eletrocardiogramas, eletroencefalogramas e ressonâncias magnéticas enquanto cheiram, olham, sentem, comem e expressam o que acontece com todo o seu ser. Eles nem precisam falar: as máquinas em comunicação direta com os cérebros fazem isso por eles. Chama-se neuromarketing: sistemas de exploração biomédica adaptados para encontrar objetos que sejam irresistíveis.

E isso  funciona. Os ultraprocessados ​​não param de crescer em vendas e vão ganhando momentos do dia que antes eram destinados aos alimentos sem processar. Junto com esse consumo, aumentam as doenças não transmissíveis.

Por tudo isso, uma das propostas mais importantes das campanhas de saúde pública em todo o mundo está centrada em interferir nas embalagens: quebrar o encanto que nos deixa hipnotizados. Uma ideia que as marcas assumiram diretamente como uma declaração de guerra.

Na maioria dos países latino-americanos, há atualmente uma batalha tenaz e sem trégua sendo travada pela sociedade civil e profissionais de saúde que lutam por leis de rotulagem frontal, limites de publicidade e impostos que aumentem o preço desses alimentos artificialmente baratos.

A indústria de alimentos atua nos bastidores, dificultando cada avanço. Mas não improvisam nada, já contam com uma espécie de manual de dez passos que repetem em cada país que busca avançar.

Nestlé, Coca Cola, Kellogg’s, Uniliver, Danone, Ferrero, Pepsico: há pelo menos 10 anos diferentes pesquisadores reúnem evidências para mostrar como essas empresas operam.

A dinâmica inclui estratégias para atrasar as leis, compra de vontades políticas e do mundo da ciência e da saúde, a criação de uma narrativa poderosa com seus diversos mecanismos de legitimação, filantropia publicitária e ainda medidas mais agressivas como ações judiciais e intimidação.